sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Conflito Homossexualidade X Fé

Clique na imagem para assistir ao filme Prayer for Bobby (legendado)

"Eu não posso deixar que ninguém saiba que eu não sou hétero. Isso seria tão humilhante. Meus amigos iriam me odiar, com certeza. Eles poderiam até me bater. Na minha família, já ouvi várias vezes eles falando que odeiam os gays, que Deus odeia os gays também. Isso realmente me apavora quando escuto minha família falando desse jeito, porque eles estão realmente falando de mim... Às vezes eu gostaria de desaparecer da face da Terra."


Estas palavras estão escritas no diário de Bobby Griffith, quando tinha 16 anos. Bobby foi um homossexual americano que viveu o drama de ser gay e pertencer a uma família cristã fundamentalista nos anos 80. Sua mãe, ao descobrir sua homossexualidade, faz de tudo para que seu filho seja “curado” daquilo que ela considera ser uma ameaça para sua salvação. Bobby passa então a viver um conflito ainda maior, já que sua mãe não aceita ter um filho gay. Sua relação familiar fica abalada. Com o tempo Bobby decide ir morar com uma prima em outra cidade onde conhece um rapaz e começam a namorar. Ao visitar seus pais e dar a notícia do seu relacionamento, sua mãe não aceita e eles têm uma pequena discussão. A mãe de Bobby diz “Eu não terei um filho gay”, Bobby então responde “Okay, então você não tem um filho”. Bobby retorna para a casa de sua prima e depois de algum tempo ele não resiste as opressões internas e externas e se suicida, jogando-se de uma ponte. Era o fim daquele “problema” para sua mãe. Só então é que ela percebe o grande erro que cometeu, e começa a buscar respostas para tudo aquilo. Mary Griffith torna-se então uma ativista e passa a ajudar outras famílias a entender e superar o conflito da homossexualidade dentro do lar.

Milhões de adolescentes enfrentam neste exato momento a mesma situação que Bobby enfrentou. Para a maioria dos homossexuais, o início da aceitação é bastante complicado, e isto se agrava ainda mais quando a religião é fortemente presente no âmbito familiar. A primeira fase deste processo é a aceitação própria. Nascemos numa sociedade que considera o simples fato de ser “gay” um pecado do qual devemos nos arrepender. Mas como se arrepender de algo que não temos escolha ? A tão dita “opção sexual” é uma falácia. Não existe uma opção sexual, afinal de contas, isto não funciona como o processo de compra de um vestuário, onde vamos a uma loja e temos várias “opções” de modelo, corte e cor. Não existe uma idade na qual nos é dada a “escolha” de nos sentirmos sexualmente e afetivamente atraídos por alguém do mesmo sexo ou do sexo oposto. Isto é algo que simplesmente acontece, mas por causa do que aprendemos desde pequenos, na maioria das vezes tentamos sufocar aquilo que sentimos, por medo de sermos condenados, de sermos mal falados, de termos nossa reputação manchada, de sermos hostilizados. A maioria de nós esconde aquilo que sente por muitos anos. Vivemos um conflito diário de Fé X Sexualidade. São duas realidades totalmente opostas uma à outra, mas que tem igual impacto nas nossas vidas.

Por causa do medo, uma grande parte dos homossexuais evangélicos acaba se envolvendo com alguém do sexo oposto. Isto aconteceu comigo e acontece com a maioria dos gays cristãos. Tememos uma vida solitária, sem ninguém para amar, sem uma família para nos apoiar, sem amigos que nos entendam. Tememos a rejeição daqueles que amamos. Tememos sermos desprezados por Deus, pela “escolha” de rejeitar o sexo oposto e cometer um “ato abominável” com alguém do mesmo sexo. Acabamos vivendo uma vida depressiva, não entendendo o porquê de todo este sofrimento. Por que ser assim? Por que amar alguém do mesmo sexo? Quantas vezes prometemos a nós mesmos não olharmos para alguém e sentirmos atração, como se isto fosse algo que estivesse ao nosso alcance? Parece que quanto mais buscamos respostas, menos as encontramos.

Cada ser humano tem sua própria história, sua própria experiência de vida e não podemos nos basear em um único individuo para tomarmos decisões que guiarão nosso curso de vida. Existem vários fatores que pesam na hora de decidirmos o que fazer e quando fazer. Alguns homossexuais decidem viver ocultando sua orientação pelo resto da vida, quer se relacionem afetivamente com alguém do mesmo sexo quer não. Outros decidem logo no início sair do armário e não esconder da família e da sociedade o que sentem. Alguns lutam por muito tempo contra seus sentimentos até que decidem não mais viver de aparências e resolvem contar à família e aos amigos mais íntimos sua orientação sexual. O choque é quase sempre inevitável. Isto acontece porque a sociedade assume que todas as pessoas devem ser heterossexuais e que apenas alguns poucos “decidem” ser gays ou lésbicas, mas quando vêem alguém que por muito tempo estava escondido em uma aparente orientação hétero sair do armário, começa então a aflorar um entendimento de que ser gay não está diretamente relacionado aos esteriótipos existentes e que há sim muitos homossexuais que são pessoas comuns, que trabalham, estudam, são honestas e fazem o bem ao próximo, que amem e que também desejam ser amadas. Claro que nem todo mundo pensa igual. Entra então a segunda fase da aceitação do indivíduo: a de amigos e parentes.

Para muitos, a família e a igreja são as instituições mais difíceis de encarar quando o assunto é homossexualidade. Muitas famílias são extremamente tradicionais, compostas por pais e irmãos machistas intolerantes. Nesta atmosfera o processo de saída do armário torna-se muito mais difícil, uma vez que a pessoa sente-se desestimulada a confiar seu então segredo às pessoas que mais ama, mesmo que ela já tenha aceitado internamente sua orientação sexual. A igreja pode ser um agravante ainda maior, já que na maioria das denominações homossexualidade é sinônimo de pecado e ser um gay assumido pode significar a perda de privilégios – tais como o cargo de auxiliar de jovens ou o ministério de músico na Congregação – na comunidade religiosa, em alguns casos mesmo que o indivíduo não tenha tido relações homoafetivas. Isto acaba levando muitos homossexuais a viver uma vida dupla, onde no convívio familiar, social e religioso eles assumem um perfil hétero, muitas das vezes casando-se para ocultar seu verdadeiro eu, mas acabam por viver “aventuras proibidas” longe dos olhos de seu círculo social para satisfazer suas necessidades e desejos mais íntimos.

De modo geral, o fato de ser gay e cristão evangélico é quase sempre um processo que envolve
muitos medos, desejos e frustrações. É uma luta do entendimento racional aprendido contra o sentimento sexo-afetivo, que acaba por gerar no indivíduo um árduo conflito que, em muitas das vezes, o obriga a tomar decisões difíceis, como abandonar a religião ou viver nela ocultando das pessoas esta verdade, driblando constantemente indagações acerca de relacionamentos dos quais em muitas das vezes estas pessoas acabam se privando.

Para finalizar, existe um capítulo bíblico bastante conhecido, uma das epístolas paulinas, que pode ilustrar bem claramente o conflito que a maioria dos homossexuais enfrentam quando estes são evangélicos:



Romanos 7

7: Que diremos pois? É a lei pecado? De modo nenhum. Mas eu não conheci o pecado senão pela lei; porque eu não conheceria a concupiscência, se a lei não dissesse: Não cobiçarás.
8: Mas o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, operou em mim toda a concupiscência; porquanto sem a lei estava morto o pecado.
9: E eu, nalgum tempo, vivia sem lei, mas, vindo o mandamento, reviveu o pecado, e eu morri.
10: E o mandamento que era para vida, achei eu que me era para morte.
11: Porque o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou.
12: E assim a lei é santa, e o mandamento santo, justo e bom.
13: Logo tornou-se-me o bom em morte? De modo nenhum; mas o pecado, para que se mostrasse pecado, operou em mim a morte pelo bem; a fim de que pelo mandamento o pecado se fizesse excessivamente maligno.
14: Porque bem sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido sob o pecado.
15: Porque o que faço não o aprovo; pois o que quero isso não faço, mas o que aborreço isso faço.
16: E, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa.
17: De maneira que agora já não sou eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim.
18: Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem.
19: Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse faço.
20: Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim.
21: Acho então esta lei em mim, que, quando quero fazer o bem, o mal está comigo.
22: Porque, segundo o homem interior, tenho prazer na lei de Deus;
23: Mas vejo nos meus membros outra lei, que batalha contra a lei do meu entendimento, e me prende debaixo da lei do pecado que está nos meus membros.
24: Miserável homem que eu sou! quem me livrará do corpo desta morte?
25: Dou graças a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor. Assim que eu mesmo com o entendimento sirvo à lei de Deus, mas com a carne à lei do pecado.

2 comentários:

  1. O meu problema são os conflitos entre os meus princípios e os meus sentimentos.
    É muito triste para alguém que nasceu na graça, sempre amou os princípios rígidos de uma família conservadora e da Congregação, saber ao crescer que possui sentimentos homossexuais. Eu não consigo aceitar esses sentimentos que involuntariamente me atormentam dia e noite; eu não consigo sentir bem comigo mesmo, e assim criei uma auto-rejeição. Eu me odeio, considero-me um lixo, uma vergonha para minha família. Não tenho coragem de buscar ajuda da família, de psicólogos e contar a verdade a eles, pois isso fere meu ego, eu acho humilhante ter que dizer a família que eu não sou um rapaz normal, como meu irmão mais velho é. Eu não tenho nada contra aqueles que se adaptam bem a vida homossexual e respeito eles por isso, apenas não consigo fazer com que eu me sinta bem com esses desejos; por diversas vezes já peguei o carro e dirigi em velocidade alta na rodovia que fica perto de casa, já cheguei a tomar remédios em excesso, já orei muitas vezes pedindo a morte, mesmo tendo apenas 19 anos. Não sei o que fazer. Na minha mente meus desejos homossexuais entram em conflitos constantes com meus princípios.
    É uma guerra solitária.
    Uma guerra interminável.
    Uma guerra entre aquilo que eu gostaria de ser e aquilo que sou.
    Uma guerra entre a mentira e a verdade.
    Uma guerra entre a aparência e a realidade.
    Uma guerra sem vencedores (não quero que meus sentimentos vençam, mas não consigo vencê-los).
    É muito triste saber que promessas como a que está em 128 de Salmos e 9 de Eclesiastes nunca cumprirão na minha vida:
    “A tua mulher será como a videira frutífera aos lados da tua casa; os teus filhos como planta de oliveira à roda da tua mesa. Eis que assim será abençoado o homem que teme ao Senhor.”
    “Goza a vida com a mulher que amas, todos os dias de vida da tua vaidade...”
    Eu sei que para Deus todas as coisas são possíveis, como o anjo Gabriel disse a Maria na anunciação, e que Jesus disse que se tivesse fé do tamanho de um grão de mostarda, faria obras maiores do que as que ele fez; mas a cada dia minha fé diminui mais ainda, por causa da esperança de libertação que nunca chega; como Salomão disse em provérbios: “A esperança demorada enfraquece o coração...”
    Acho que apenas serei vitorioso na morte, como disse Jó: “Ali (morte) os maus cessam de perturbar e ali repousam os cansados.”
    Que esse dia não demore. Amém!

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  2. Meu irmão, já passei por tudo isto. Hoje estou feliz, de bem comigo mesmo e livre de qualquer terror psicológico da religião. Espero que você consiga superar isto também.
    A paz de Deus.

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